Literatura oriental e literatura ocidental, qual a diferença entre elas
Victor Mendonça: Raquel, eu estava pensando sobre literatura infantojuvenil e em como encaramos esses produtos: sejam livros infantojuvenis, filmes ou peças de teatro. Há uma diferença entre a cultura oriental e a ocidental com relação a essa percepção. Por que estou falando isso?
Porque eu sei que, dentre nossos espectadores, tem muitos fãs do diretor Hayao Miyazaki, que é considerado o Walt Disney japonês. Ele tem vários filmes que são bem reflexivos e metafóricos, voltados para crianças e diferentes daqueles filmes bem-humorados e comerciais, de Hollywood, por exemplo. Mas, tem um livro que eu tenho particular carinho e que, recentemente, eu assisti ao filme que foi baseado nele, que se chama “O menino e a cerejeira”. O filme conta a história de um garoto que perdeu o pai na guerra, no Japão pós Segunda Guerra Mundial. A mãe dele trabalha engraxando os sapatos durante o dia e pede a ele, para não sair de casa. Mas com muita saudade da mãe, ele acaba saindo certo dia. Ele encontra um senhor, já velhinho, que cuida de uma cerejeira.
Na filosofia oriental, a cerejeira tem toda uma simbologia de força e de esperança. Esse filme é baseado no livro do Daisaku Ikeda, sobre o qual eu escrevi no meu último livro, Ikeda, um século de humanismo. Essa cerejeira foi a única coisa que sobreviveu de um bombardeio durante a guerra. A gente observa o quanto a literatura infantojuvenil japonesa é diferente de algumas literaturas, digamos, mais comerciais. Na literatura infantil oriental, os autores acreditam no entendimento das crianças, eles percebem a capacidade da criança. Não estou falando que os ocidentais não percebam. Mas, os orientais têm essa característica mais marcante ao acreditarem na capacidade da criança de entender temas pesados e densos, mas com leveza, delicadeza, sensibilidade e ludicidade. Qual que é a sua avaliação disso, Raquel?
Raquel Romano: Sim, a diferença de culturas existe de fato. A cultura oriental traz sempre uma proposta reflexiva, sem perder a ludicidade, traz o potencial afetivo. A criança já é inserida nesse universo reflexivo e eles já ganham duas vezes na educação da criança. Ela se torna criativa, porém com conteúdo, com o pensar, com uma ressignificação da vida.
Por exemplo, eu gosto muito de **Haikai. Escrevo e sou discípula do haikai.Esse estilo oriental traz a essência da vida e do mundo, de uma forma simplificada. Então, esse entendimento é muito bem aproveitado pelo leitor e pelas crianças. Quando a gente faz haikai, você tem o exercício de síntese sobre a vida, sobre o mundo, o momento. É uma introspecção muito grande, mas com um olhar para fora, um olhar para o mundo. A literatura oriental, como você disse sobre “O Menino e a cerejeira” é bem isso: esse olhar para fora, para o humano, mas interconectado com seus sentimentos e valores. É uma cultura maravilhosa.
Victor Mendonça: A gente tem muito a aprender com esse diálogo cultural entre esses dois estilos, digamos assim. Eu até encontrei na minha estante o livro O menino e a cerejeira que eu tenho e guardo com muito carinho.
0 Comentários